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Meio bruxa, meio irônica, meio soturna, bem exibida, bem provocativa, bem melodramática: foi assim que Letrux subiu ao palco do Opinião, na última sexta-feira, dia 29, para apresentar Aos Prantos, seu mais recente álbum.

“Déjà-Vu Frenesi” foi o pontapé inicial na busca coletiva pelas conexões que poderiam ter esfriado durante o distanciamento social. Aviso: não esfriaram. Ou mais: ficaram ainda mais latentes, visto que o público gritava “Letícia! Letícia! Letícia!” antes mesmo da artista subir ao palco. Aos Prantos, lançado em 2020, parecia prever o momento de absoluta fragilidade que vivemos nos últimos dois anos. Um período de transição, de reflexão, de conexão com o que realmente importa.

Foto: Carol Govari

Aos Prantos é anos 80, pós-punk, eletrônico; mas também é samba e poesia. Não é um disco – e um show – de fossa, mas de introspecção, que, no palco, ao ser intercalado com faixas explosivas do Em Noite de Climão, garante um show que é a cara da vida: pranto, prazer, climão, gargalhada, sexo, angústia, suor, delírio solitário que, durante o espetáculo, vira um delírio coletivo. A troca foi abundante e constante: um público apaixonado, que recebeu resposta e foi saudado por estar ali presente. Letícia conversou muito, chamou Pedro Cassel para cantar “Merthiolate”, fez mágica, tocou teclado e contou com uma banda absurdamente foda para celebrar a noite.

Aos Prantos não é uma extensão de Em Noite de Climão e retrata outro momento da vida e da obra de Letícia. Isso não significa que sejam discos antagônicos, visto que a artista conseguiu fazer um roteiro onde as 18 canções apresentadas em Porto Alegre contassem uma história que pode ser dela, ser minha, ou ser tua: estamos vivos, sobrevivemos e, mesmo que o país não colabore, precisamos aproveitar até a última gota de lágrima, suor e gozo.

Não vejo outra forma de começar esse texto, senão com uma exposição: eu nunca fui ouvinte da Fresno. Até pensei em omitir esse dado, mas achei que seria desonesto da minha parte. Na infância/adolescência, fui cooptada pela vertente bagaceira & chinelona do rock produzido em Porto Alegre, então toda e qualquer manifestação musical diferente disso foi deliberadamente ignorada por mim. Mas isso não significa que eu não tenha acompanhado, como observadora, a história da banda: vi a Fresno surgir, sair de Porto Alegre, assinar com uma grande gravadora e liderar uma subcultura que “voltou” (embora, para os fãs, nunca tenha ido a lugar algum) à tona: o emo.

Mesmo sem ser ouvinte, sempre achei a Fresno muito foda. Uma banda madura, com uma coerência identitária que não é abalada pela troca de sonoridade. Muito pelo contrário: a coerência é reforçada a cada lançamento, onde a banda se mostra cada vez mais livre de amarras sonoras e escreve sua própria narrativa na história da música nacional. E essa liberdade aparece não só na parte sonora, mas também na composição das letras – e no salto que a banda deu nos últimos discos, em especial no sua alegria foi cancelada e no excelente Vou Ter Que Me Virar (sim, esse eu ouvi várias vezes) –, que passou pelo palco do Araújo Vianna, em Porto Alegre, no dia 23 de abril.

Foto: Carol Govari

A banda estreou sua nova turnê na cidade onde tudo começou, se apresentando para um auditório repleto de fãs, que fazem parte dessa comunidade há mais de duas décadas, e também para novos espectadores (o/) que, desconfio, saíram do Araújo muito bem impressionados. A Fresno fez um show pesado, político, profundo e poético. Chorou a morte de um amigo (o show foi dedicado a Rafael Kent), saudou a vida de todos que ali estavam após dois anos de pandemia. Intercalou os maiores hits com canções do novo disco, mesclando baladas românticas com punk rock e música eletrônica. Falou que eles odeiam gente como nós e que em cada gota dessa chuva (que, inclusive, cai agora sobre Porto Alegre) você vai sentir minhas lágrimas. Retratou uma geração que tem que se virar, que é a maré viva, e que só com muita terapia consegue (ou ao menos tenta) espantar os fantasmas dessas malditas casas assombradas. Acho que todo show tem uma certa dimensão terapêutica, mas, honestamente, eu nunca tinha visto um público tão expressivo e entregue. O show da Fresno não tem uma dimensão terapêutica, ele é a própria terapia: o choro de soluçar, a lágrima que escorre no canto do olho, o grito, o sorriso, a mão batendo no peito; tudo rumo à uma libertação, mas não sem antes passar pelos tortuosos caminhos que se chocam dentro de nós.

Arrisco dizer – mesmo sem muita propriedade – que a Fresno está em um dos melhores momentos da carreira. Quiçá no melhor momento da carreira NO MUNDO – como tudo que nasceu em Porto Alegre. Veja o show e me diga se eu estou errada, por favor. Uma banda conectada, sólida, com uma transparência e experimentação musical que agrada não só aos antigos fãs, mas também atrai novos admiradores; seja por causa do posicionamento político, seja pela particularidade que os diferencia da maioria das bandas do atual cenário (mainstream) do rock nacional, seja pelas cada-vez-melhores composições do Lucas, que faz um duo mano-a-mano com o maior hitmaker da música pop brasileira na maravilhosa “Já Faz Tanto Tempo”, um dos pontos mais altos do show.

Sei que os ingressos estão esgotados na maioria dos lugares, mas, se tu puder, arrume um ingresso e presencie esse momento da banda. Garanto que tu não vai te arrepender.

Bom, acho que esse texto é bem claro: em 2022, eu virei fã da Fresno.

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Foto: Carol Govari Nunes

Na última quarta-feira, dia 16, rolou no Opinião a estreia do espetáculo De Volta Para a Garagem – uma peça de teatro/show que remete a um encontro fictício entre Biba Meira, Edu K, Frank Jorge, Flávio Basso e Charles Master, abordando toda a música, angústia, chinelagem, diversão e repressão vivida durante os anos 80 em Porto Alegre.

O encontro acontece em uma noite chuvosa, onde os músicos se unem sob um teto para esperar a chuva passar – e o amanhecer chegar – e, enquanto isso, conversam, bebem, deliram e fazem música. Tópicos como viver de rock’n’roll, questões identitárias, as dores e as delícias de viver em Porto Alegre, fracasso, putaria, o sonho de se tonar um ídolo mundial (maior que os Beatles, tal qual Flávio Basso certamente foi – pelo menos aqui em Porto Alegre), astrologia, budismo, censura e outros vários assuntos surgem durante a noite.

Com texto inicial baseado no belíssimo Pode ser que seja só o leiteiro lá fora, de Caio F, e texto final e direção de Bob Bahlis, De Volta Para a Garagem diz ser uma “homenagem ao rock gaúcho”, mas acredito ser muito mais do que isso: é uma homenagem à trupe que habitou o bairro Bom Fim em sua década de maior efervescência e resistência, e compila, em uma só noite, rastros de poesia, literatura, música e teatro, tudo ao som do que, agora sim, ficou conhecido como “rock gaúcho” e suas principais bandas: Taranatiriça, Defalla, Julio Reny, TNT, Os Cascavelletes, Graforréia Xilarmônica, Os Replicantes, Bandaliera, entre outros. Ou seja, o “rock gaúcho” atua, na peça, como um guarda-chuva que abriga tudo o que o rótulo – odiado por uns, amado por outros – significou para essa geração que estava recém saindo de uma ditadura militar, que queria se expressar, se divertir, que sentia-se culpada – ou simplesmente era apontada como culpada – por ser diferente e que, mesmo tomando atraque da polícia em plena Osvaldo Aranha, seguia fazendo arte e resistindo culturalmente. E resistiu tanto – e fez tanta, tanta arte – que mais de 30 anos depois ainda estamos aqui, reverenciando tudo o que essa década significou para a cultura gaúcha.

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Grandes sucessos do rock gaúcho foram tocados pelo elenco (Foto: Carol Govari Nunes)

O elenco é composto por Bruno Bazzo (guitarra, ator), Leonardo Barison (gaita, ator), Nina Rouge (cantora, atriz), Samuel Reginatto (guitarra, ator) e Zé Fernandes (contrabaixo, ator).  Os músicos que reforçam a banda são André Hernandes (Guitarra) e Tazz Goetems (bateria).

Ao final da noite, Bob Bahlis subiu ao palco para fazer um agradecimento e chamou Charles Master e Biba Meira, presentes na plateia, para se juntarem aos atores/músicos. Rolou “Não Sei”, um dos maiores clássicos do TNT, e no vídeo abaixo você pode conferir como foi:

“Não escreve sob o império da emoção.
Deixa-a morrer, depois a revive.
Se és capaz de revivê-la tal qual como a viveste,
chegaste, na arte, à metade do caminho”.
(Horacio Quiroga em Decálogo do perfeito contista).

Eu nunca escrevo sob o império da emoção após um show. Levo em média uns 4 ou 5 dias para compreender todos os sentimentos despertados, e só então me sento, o revivo, e escrevo. Esse é meu modus operandi, basicamente.

Mas dessa vez eu resolvi testar uma coisa diferente; achei que a data – dia do compositor brasileiro e aniversário da Pitty – pedia um esforço da minha parte. Se vai dar certo, eu não sei, então vamos ver o que vai sair daqui.

Bem, eu escrevo sobre shows da Pitty há quase 10 anos; e eu vejo shows da Pitty há 15 anos. Às vezes, penso que não tenho mais nada para escrever sobre, embora eu precise externar o que eu sinto sobre, se é que isso faz algum sentido. Várias pessoas ainda me perguntam por que eu assisto ao “mesmo” show há mais de uma década. Pra responder, recorro ao que escreveu Jorginho Cardoso Filho, em 2011, sobre as formas de apreender a experiência estética, exemplificando a efemeridade através dos encontros entre um homem e um rio: quando se percebe que determinado encontro não se repetirá, abre-se a possibilidade de fruir a particularidade de cada encontro de maneira única e intensa. É mais ou menos dessa forma que vejo meu encontro, enquanto público, com a Pitty em um palco: ele não se repete, porque é excepcional e efêmero. E o encontro com o show de lançamento do Matriz não seria diferente.

MATRIZ 2.0

No sábado, dia 5, Pitty apresentou seu novo disco, recentemente indicado ao Grammy Latino de Melhor Álbum de Rock ou de Música Alternativa em Língua Portuguesa, no Pepsi on Stage, em Porto Alegre. Após uma playlist impecável com o melhor do dancehall, dub, early reggae, rocksteady y otras cositas más feita pela cantora especialmente para os shows, o som sobe com “Legalize It”, do Peter Tosh, avisando que o show está para começar.

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Momento “quartinho em Salvador”, onde a artista apresenta o embrião de algumas músicas, como “Teto de Vidro” e “O Lobo”. Fotos: Carol Govari

De cara, somos apresentados ao álbum Matriz por meio do vídeo de “Bicho Solto”, feito por Otavio Sousa e com imagens captadas por Alisson Louback, enquanto a banda entra no palco. Pitty abre o show com “Ninguém é de Ninguém”, seu single mais recente – e uma das músicas preferidas da galera –, enquanto somos engolidos pela projeção do videoclipe.

O Matriz 2.0, em Porto Alegre, apresentou nove (contando “Bicho Solto”, no começo) das 13 faixas do disco novo. Matriz, como muitos já sabem, aconteceu de forma orgânica, na estrada, e Pitty recupera e articula diferentes referências e gêneros musicais ao longo do disco. Me impressiona, muito, como Pitty fez tudo isso funcionar no palco. Sempre pensei que “Redimir”, uma das minhas faixas preferidas, não funcionaria ao vivo. Mas ela funciona tanto – mas tanto! – que sigo até agora impactada, com aquela batida no meio do meu peito e as palmas ecoando na minha cabeça. Se fecho os olhos, vejo Pitty ali na frente do monitor do Martin, com aquele foco de luz a iluminando, o resto do palco todo escuro. Um absurdo. Hipnotizante. “Bahia Blues”, digna de uma peregrinação de fãs por Salvador, é outra faixa que no disco eu acho incrível, mas também achava que poderia ficar meio linear ao vivo, e preciso dizer: eu nunca me senti tão feliz por estar completamente enganada. “Noite Inteira” é a voz da resistência, entoada pelo público no maior clima de união; e “Te Conecta”, que apareceu na turnê anterior dando pistas de onde Pitty poderia chegar, faz infinitamente mais sentido, agora, nesse show.

“Roda”, com participação de Russo Passapusso e Beto Barreto, do BaianaSystem, foi o momento em que a banda passou de trator em cima da galera. E eu sei que parece contraditório dizer que a banda “passou de trator” em cima do público, sendo que foi, talvez, o momento mais explosivo do show, mas é a única forma de expressar o que senti naquele momento.

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“Motor”, uma das partes mais envolventes do show

“Motor” é a parte que chega ~dói aqui dentro. Linda, sensível, tri bem pensada entre “Na Sua Estante” e “Redimir”. Na verdade, tudo nesse show transparece que foi muito bem pensado. Há uma história sendo contada, com retomadas ocasionais ao passado, como o momento “quartinho de Salvador”, mas com uma narrativa muito bem amarrada e em direção ao futuro, vide “Submersa”, que lindamente faz com que a gente saia daquele quartinho e retorne a 2019. Matriz 2.0 tem um show eficaz, com quadros cênicos, onde a plateia não enxerga os andaimes da construção: é coeso, coerente. Há uma progressão que começa em “Bicho Solto” e termina em “Serpente”, no bis; um caminho por onde Pitty abusa de toda a sua competência pra manter o público imerso naquilo que ela oferece de melhor: uma performance ao vivo.

Além disso, a artista mostra um baita trabalho braçal e está presente em 100% da noite que entrega: da playlist que toca antes do show, passando pelo roteiro cenográfico, projeções, iluminação, direção; ou seja, tudo ali reflete seus posicionamentos e colabora para que o show aconteça de forma catártica.

PROJETO PALCO ABERTO

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Alice Kranen, a artista convidada para o Palco Aberto de POA

Um dos diferenciais da turnê Matriz é o Palco Aberto, projeto onde bandas locais abrem o show de Pitty. Parceria da cantora com a TNT Energy Drink, o projeto tem curadoria de Tony Aiex, editor-chefe do site TMDQA, e acaba dando espaço para que novos artistas – todos com projetos autorais – sejam conhecidos por um público maior, fomentando a cena local. Já passaram pelo projeto Flaira Ferro (PE), Mulamba (PR), Violet Soda (SP) e Ouse (CE). Em Porto Alegre, a artista convidada foi Alice Kranen, uma cantora e compositora de apenas 14 anos, que traz bastante influência de blues, folk e rock em suas composições. Visivelmente emocionada, Alice conduziu muito bem seu show, tocando violão em todas as músicas, e apresentou os singles “Travas em Portas” e “Talvez”, entre canções próprias e covers, como “Zombie”, do The Cranberries.

O projeto Palco Aberto é uma das coisas mais legais que estão acontecendo na música, atualmente. Pitty, que veio do underground, faz uma ponte entre o cenário independente e o mainstream, pois sabe como é importante fornecer espaços para que novos talentos mostrem seus trabalhos. É uma oportunidade que certamente marca a carreira – e a vida – desses novos artistas.

Outras informações sobre o projeto Palco Aberto, que ainda vai rolar em mais 16 cidades, você encontra clicando aqui.

7 DE OUTUBRO

Como comentado no início deste texto, hoje, além de ser o dia do compositor brasileiro, é aniversário da Pitty. Sou péssima com demonstrações públicas de afeto – apesar de achar que esse texto está beeeem claro –, mas uso esse finalzinho pra parabenizar a minha compositora brasileira preferida, uma das artistas mais gentis que eu tenho a sorte de conhecer, e que mesmo depois de 15 anos segue me instigando e me fazendo voltar pra ver o que ela vai aprontar no palco. Feliz ano novo, Pitty ❤

Elza Soares, ou melhor, Doutora Elza Soares, definitivamente uma das maiores artistas da nossa época, passou com sua turnê Deus é Mulher pelo Opinião, em Porto Alegre, no último sábado, 25 de maio.

Depois de dois anos sem se apresentar em Porto Alegre, a Voz do Milênio (eleita pela BBC de Londres) cantou as músicas do seu disco mais recente, o elogiadíssimo Deus é Mulher, e sucessos que traz ao longo de toda a sua carreira.

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Elza e banda, sob forte aplauso, ao final do show (Foto: Carol Govari Nunes)

Uma banda excelente acompanha Elza nessa turnê, que tem direção musical de Guilherme Kastrup (também é o baterista da banda). Além de Guilherme, vemos no palco Rodrigo Campos (guitarra e cavaco), Rafa Barreto (guitarra e Synth), Luque Barros (baixo e synth), Da Lua (percussões) e Rubi (vocais). Na verdade, essa banda não “acompanha”, somente, Elza; essa banda faz um show que preenche todo o ambiente: é vivo, pulsante, uma delícia de assistir. E sentada em seu trono, tal qual a rainha que é, Elza Soares emociona tanto que eu nem encontro adjetivos suficientes para explicar.

Vê-la ao vivo, cantando com aquela voz inconfundível, é um privilégio. Para além de sua voz excepcional, a presença de Elza no Opinião foi marcada pela força, garra, gentileza, generosidade, humildade e gratidão que a cantora transpira.

Sob aplausos e gritos constantes da plateia, que entoava repetidamente “Doutora! Doutora! Doutora!”, título que recebeu no domingo, 26, na UFRGS, por sua relevância artística e também por causa de sua vida pública no combate ao racismo e à promoção da cultura afro-brasileira – este foi o primeiro título de Doutora Honoris Causa concedido a um músico pela universidade, vale lembrar –, Elza defendeu os professores, as universidades públicas, falou do direito à educação e de como a educação transforma vidas. Um show político e extremamente necessário dentro do contexto em que nos encontramos.

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Elza Soares – Deus é Mulher (Foto: Carol Govari Nunes)

Elza falou também de sua relação de amor com a cidade e com o amigo Lupicínio Rodrigues, que a trouxe para Porto Alegre para fazer o primeiro show profissional de sua carreira. Além do amor por Porto Alegre e por seu povo, falou da necessidade do amor em tempos de ódio, contagiando o público (super diverso em gênero, raça e idade), que a respondia fervorosamente em todos os momentos.

Com seu disco anterior, A Mulher do Fim do Mundo, que lhe rendeu um Grammy Latino de melhor álbum de música popular brasileira, Elza se conectou com um público novo, virtual, necessitado de referência e representatividade. Hoje, com seus quase 70 anos de carreira, a artista, com o disco Deus é Mulher, reforçou seu lugar de fala e atinge cada fez mais todas as faixas etárias – consolidando-se como porta-voz de um povo faminto por discursos coerentes e letras que falem sobre o empoderamento da mulher, a força dos negros, o direito das minorias; letras que falem sobre dar, comer, denunciar, gritar; letras que são puro sentimento e verdade quando saem de sua boca.

 

Elza Soares, a neta e bisneta de escravas, a mulher, mãe, a encaixotadora, a cantora, aquela que não foi levada à sério, aquela que, entre deboches e risadas, respondeu que veio do “planeta fome”, a artista gigantesca, a ativista, a mulher do fim do mundo, a voz do milênio, a doutora honoris causa: que privilégio vê-la ali, diante de mim, cantando ao vivo. Obrigada, Elza.